sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Quem acredita na historinha da maçã? – Parte Final


Será que a Bíblia não tinha um meio, ao menos mais elaborado, de contar como se deu o primeiro pecado? Afinal, o relato de Gênesis 3 parece simplório e infantil demais, para quem se habituou ao sofisticado mundo dos computadores e da malícia explícita.

Penso que seria conveniente você ler primeiro Gênesis 3 e, depois, o texto anterior desta coluna, do qual este é a conclusão. Assim, você, mesmo que já tenha lido a primeira parte, terá as informações mais frescas, na mente.

Não há quem chegue à idade da razão sem questionar como pode haver um Deus bom, quando o mundo que Ele criou está cheio de perversidade. A resposta está sempre na ponta da língua: “Deus fez tudo perfeito e bom; foi o pecado do homem que estragou tudo”. Essa resposta até que satisfaz, pois, de todo o mal que existe, a maior parte vem sem dúvida alguma do coração perverso do ser humano. O problema, então, não está em se atribuir a origem do sofrimento ao pecado, mas na forma como a Bíblia descreve a primeira iniqüidade. Por que a narrativa que explica a causa de todo tipo de desgraça no universo é tão infantil?

Temos, em Gênesis 3, um casal que vivia em perfeita harmonia entre si, com a natureza e, sobretudo, com o Criador. Até o belo dia em que uma cobra falante pôs minhocas na cabeça da mulher, e esta resolveu desobedecer a Deus, comendo um fruto proibido. Depois disso, o mundo perfeito conheceu todo tipo de desgraça.

De fato, aparentemente, essa historinha é simples demais para explicar tanto sofrimento. Afinal, Deus não foi excessivamente duro com Suas criaturas? Qual pai não sabe que proibir alguma coisa só faz aguçar a curiosidade do filho? E o erro de Eva, por acaso teria sido assim tão grave? “Puxa vida”, diríamos, “ela e seu marido estavam apenas matando a curiosidade despertada pela proibição divina e pelas palavras sagazes da serpente. Será que foi tão difícil assim para Deus compreender isso?”, perguntamos no íntimo do nosso coração. E, desse modo, acabamos construindo uma imagem negativa do Senhor em nós; um Deus intolerante, inflexível, incapaz de compreender um pequeno deslize humano perfeitamente aceitável, dadas as condições descritas no texto.


Tudo isso, além da bendita questão da nudez, faz com que a narrativa bíblica sofra grande descrédito. Não são poucos os que acham que o pecado original nada teve a ver com serpentes e árvores, mas sim com o sexo. Tanto é assim, que a expressão “fruto proibido” tornou-se, para muitos, sinônimo de pecado sexual. Como vimos na coluna anterior, de fato, durante séculos, ensinou-se que o relato da primeira queda usava linguagem simbólica para representar a incapacidade humana de resistir ao apelo sexual. Convenhamos que o detalhe presente na narrativa bíblica de que o primeiro casal envergonhou-se de sua nudez, logo após terem transgredido o mandamento do Senhor, é forte evidência nessa direção.

No entanto, desejo mostrar aqui que, embora tudo isso seja compreensível, não há, na verdade, razão para duvidar da exatidão do relato bíblico, nem para desconsiderar sua linguagem aparentemente infantil. Nosso equívoco está em esquecer que a Bíblia não foi escrita só para nós, da era dos computadores e das sondas galácticas, mas para todos os homens, de todos os tempos e de todas as culturas. Muitos me perguntam: “Pastor, por que a Bíblia não fala de dinossauro, de quasar, nem de DNA?”. A resposta é óbvia; essas coisas são passíveis de compreensão (se é que são) apenas hoje, em nosso tempo. Ora, Deus teve de escolher uma linguagem para Sua Palavra que fosse compreendida em todas as eras e culturas. Basta lembrar que Gerson, filho de Moisés, sentado no colo do pai ao ouvir as histórias da Bíblia, teria de chegar às mesmas conclusões acerca da vida e do pecado, que nós hoje, ou que nossos tataranetos em Marte. A mensagem bíblica é única e válida para todos indistintamente. Assim, como veremos a seguir, o relato da queda atende perfeitamente a essa exigência.

Consideremos, primeiro, a questão da gravidade do erro de Eva. Teria havido mera curiosidade em relação ao fruto proibido? Nossa tendência é achar que sim, porque olhamos para Adão e sua esposa com nossos olhos, isto é, como se eles fossem como nós. Ledo engano: nossos primeiros pais foram criados com poder de decisão perfeito, ou o que chamamos em Teologia de “soberania”. As escolhas humanas não eram feitas como hoje, sujeitas a equívocos ou pressões espúrias, como curiosidade ou inclinações humanas viciadas. Elas eram isentas e tomadas com absoluta consciência. Quando o inimigo sugere que, comendo o fruto, Eva e seu esposo se tornariam como Deus, conhecedores do bem e do mal, isso fez com que nossos primeiros pais resolvessem se queriam ou não conhecer o mal, porque o bem eles já conheciam de maneira absolutamente plena, como só conheceremos na Eternidade. Então, por mais estarrecedor que isso possa parecer, Adão e Eva decidiram, soberanamente, que era hora de romper com o Senhor (que ocultava deles uma realidade desconhecida), para ter contato com o mal. Eles quiseram conhecer as trevas, porque duvidaram do caráter e do amor de Deus. Ora, como Este deveria Se comportar diante dessa atitude da criatura que Ele mais amou? Repito: o homem não comeu o fruto para satisfazer uma curiosidade, mas porque desejou conhecer o lado escuro da vida, o mal, as trevas, posto que o bem ele já conhecia e vivia em plenitude, por meio de uma comunhão perfeita e intensa com Deus. Adão quis soberanamente desligar-se de Deus, pois julgou que o Criador o enganara e não era mais digno de crédito nem da fidelidade humana.


Vejamos agora as consequências da escolha humana. No texto, aprendemos que o homem tentou cobrir sua nudez, incomodou-se com a nudez de sua esposa e se escondeu do Senhor, tentando fugir de Sua presença. Isso significa que todas as relações humanas foram deturpadas com a queda. Primeiro, a relação do homem com Deus. Aquilo que dava mais prazer ao ser humano passou a aterrorizá-lo. Ele que fora criado para ser interlocutor de Deus, agora, sentia-se mal diante da presença do Senhor. Depois, a relação do homem consigo mesmo. Antes da queda, o homem não se importava com sua nudez, mas agora ele deseja mudar sua aparência, cobrir-se. O pecado corrói a autoestima e faz o homem viver “disfarçado”, fingindo para si e para os outros ser o que não é. Qualquer terapeuta começa seu trabalho, desfazendo esse disfarce em seu cliente. Em terceiro lugar, a relação com o próximo foi totalmente conturbada pela queda. Por que o homem fez aventais? Por que cobrir justamente os genitais? Sabemos claramente que o pecado original nada teve a ver com o sexo entre Adão e Eva, pois Deus mesmo os mandara (santo mandamento!!) povoar a terra (Gn 1.26-28). Ele disse: “Sede fecundos!”. Não foi o diabo que inventou o prazer, mas Deus! Bem, então, por que eles cobriram justamente os órgãos sexuais depois do pecado? Creio que aqui temos um símbolo eloqüente da perversão dos relacionamentos humanos.

Sabemos que depois do pecado, o homem tornou-se continuamente mal (Gn 6.5, 11-12) e que sua malignidade se expressava na opressão ao próximo. Ora, que relação humana existe mais profunda e íntima que o sexo? Ao se esconderem de Deus, Adão e Eva mostravam que a relação com Deus estava quebrada. Ao se vestirem, tentavam disfarçar sua auto-imagem, e, ao cobrirem os genitais, simbolizavam a deturpação de todas as relações humanas subseqüentes. Dali em diante, tudo seria diferente, inclusive entre eles mesmos (Gn 3.16).
Embora a linguagem bíblica desse texto seja simples, ela trata com absoluta competência de todas as questões envolvidas na queda humana, muito embora o preconceito impeça muitos de apreciá-las. Espero que essas poucas notas tenham ajudado você a compreender melhor a tragédia ocorrida no Éden.

6 comentários:

  1. Paz a todos! Esses elementos (maça, cobra, folha de figueira, etc...), se são símbolos ou não, isso pouco deveria importar para o crente em Jesus, que ama a Palavra de Deus, sabe da sua inerrância; até porque, não faria qualquer diferença para a firmeza da nossa Fé, se são símbolos ou se são elementos literais. Vale lembrar que a nossa fé só pode vir pela Palavra (Romanos 10:17); mas, de uma coisa precisamos ter certeza, que esses elementos são "SOMBRAS DE COISAS FUTURAS" - (Colossenses 2:17). Eu creio cegamente dessa forma, ou seja, que todo o Velho Testamento, de certa maneira, aponta para coisas futuras que serão esclarecidas à luz no Novo Testamento. O "Fruto Proibido" (figo, banana ou maçã, não importa), tem como objetivo/propósito simbolizar e nos ensinar a respeito do "pecado" como algo atrativo, belo, e gostoso, mas que nos tira a comunhão com o Pai e nos expulsa do paraíso que desfrutamos diariamente com a presença de Deus... E, a "cobra/serpente" (com perna ou asas, não importa) seria uma sombra que aponta para satanás que sempre tenta e sempre tentará nos atiçar à cobiça, pois sabe que dessa forma, facilmente nossa intimidade com o Criador é interrompida. É importante lembrar que o texto no original, atribui a característica de "astúcia" à serpente, que seria "ARUM" (‘arum = astuto); e "Nu" no original hebraico é "ARUMIM" (‘eyrumim = desnudos / nus). Percebem a correlação? Não há coisa mais atraente no universo humano (depois da queda - diga-se de passagem), que mais derruba o crente, do que a cobiça pela nudez, especialmente para os homens.... Talvez, poderíamos concluir que, eles (Adão e Eva) se perceberam nus, isto é, “serpentizados/arumitizados”, não, contudo, porque a nudez, de forma alguma, é algo maligno, como querem alguns atribuírem, inclusive, que a queda foi causada pelo pecado do sexo, ou seja, o sexo não é algo maligno, mas, sim, a astúcia que pode ou não vir acompanhada do sexo quando nossos olhos estão com os óculos da astúcia, da cobiça, da malícia, etc.... O sexo é benção de Deus e a nudez é algo divino quando acessada devidamente através do cônjuge, que é a única fonte que podemos acessar (a nudez do nosso cônjuge). Paz a todos!

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  2. Sabe de nada pastor, tá quase chegando na verdade, vai estudando...

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